O Plano Estratégico da Política Agrícola Comum para Portugal (PEPAC) foi inicialmente estabelecido pelo anterior governo num processo que desconsiderou a vontade dos agricultores, numa relação já tensa da então ministra da Agricultura com as estruturas associativas que representam o setor, o que resultou num documento desajustado da realidade agrícola nacional, não permitindo a adesão dos agricultores aos requisitos formulados e aos apoios previstos.
Devo salientar que a CAP teve conhecimento da aprovação do PEPAC pela comunicação social, o que confirma exatamente este afastamento em relação aos agricultores e às suas organizações, desde o momento inicial. De facto, todo o processo de elaboração do PEPAC padeceu de falta de transparência, de auscultação e de trabalho conjunto com o setor, o que não permite assegurar que aqueles a quem as políticas se destinam se revejam no plano que veio a ser adotado. Ainda assim, a CAP desenvolveu todas as diligências que estavam ao seu alcance para que a realidade fosse diferente e para que o PEPAC pudesse efetivamente constituir um plano para o setor e para os seus destinatários, os agricultores.
Inicialmente, a Comissão Europeia, emitiu um total de 340 recomendações dirigidas ao Ministério da Agricultura, designadamente em termos da Arquitetura Verde, correspondendo a grande parte das observações efetuadas pela CAP. Neste caso, seria expectável que o Plano fosse significativamente revisto, dando resposta às críticas mais contundentes formuladas pela Comissão, que aliás chegou a fazer depender a aprovação do PEPAC da adoção das solicitações formuladas, relativamente a questões ligadas ao ambiente, clima e biodiversidade.
Já em outubro de 2024, perante a proposta para a terceira reprogramação do PEPAC, a CAP votou contra, justificando este voto de protesto com a atuação da Administração, altamente lesiva dos interesses dos agricultores portugueses, quer quanto à forma de condução da ‘auscultação’ desde o início da construção do PEPAC, quer em termos de conteúdo.
Com efeito, não houve uma auscultação efetiva, acompanhada de verdadeiras reuniões de trabalho conjunto. Quanto ao conteúdo, as propostas da CAP não foram tidas em consideração e, não tendo sido devidamente analisadas, foram novamente ignoradas, à semelhança do que vem sucedendo desde o início deste processo.
A proposta agora apresentada pela CAP no sentido de apoiar a pecuária extensiva, a ser financiada por via do acordado no âmbito da Concertação Social, foi totalmente ignorada, violando o Acordo e prejudicando os agricultores. Tratava-se de uma medida inovadora que, por um lado, procurava introduzir maior racionalidade no dimensionamento do efetivo, questão indispensável no quadro das alterações climáticas em curso e, por outro, constituir-se como motor de arranque para melhores práticas de maneio, já que a área de pastagem em Portugal corresponde a cerca de dois terços da Superfície Agrícola Utilizada (SAU), cerca de 2,5 milhões de hectares.
Por outro lado, a grande alteração desta reprogramação, a passagem da Agricultura Biológica e da Produção Integrada para o segundo Pilar da PAC, é o reconhecimento de que a CAP estava correta quanto à manutenção destas duas medidas no segundo Pilar. Esta transferência, que foi agora proposta, ocorre por necessidade de a Administração resolver um problema por ela criado – ausência de financiamento necessário ao pagamento dos montantes previstos nestas medidas – penalizando e condicionando o investimento de forma muito séria, uma vez que é à custa dele que o pagamento destas duas medidas será assegurado. Assim, não posso deixar de considerar que se a proposta da CAP tivesse sido ouvida anteriormente, a situação acima descrita teria sido evitada: o valor do Apoio ao Rendimento Base (ARB) já pago teria sido superior e seria ainda de maior montante em 2026.
Chegados, lamentavelmente, a este ponto, o futuro exige uma Administração mais consciente, responsável, articulada e colaborativa. E para que isto suceda a mudança tem de começar imediatamente. A avaliação dos resultados do PEPAC, que ainda não temos, é fundamental para garantir a definição de uma estratégia robusta.
Diz o povo que o que nasce torto tarde ou nunca se endireita, mas os agricultores e a CAP não são de se resignar, pelo que continuamos a trabalhar para um PEPAC melhor, mais próximo e adequado aos agricultores.