A I Conferência Técnica do Olival reuniu na Universidade de Évora cerca de 20 especialistas em gestão empresarial e sustentável, num debate transformador sobre os principais desafios e oportunidades do setor. Sustentabilidade, inovação e eficiência tecnológica, fitossanidade, resíduo zero, mercado, nova legislação e PAC foram as temáticas mais discutidas no encontro organizado pela Revista Agriterra, onde se analisou o estado-da arte de uma das culturas mais enraizadas em Portugal.
Hermínia Vasconcelos Vilar, reitora da Universidade de Évora, abriu a Cerimónia de Inauguração do encontro.
Na sessão de abertura, Hermínia Vasconcelos Vilar, reitora da Universidade de Évora, sublinhou a relevância do setor para a região, recordando o papel daquela que é a segunda universidade mais antiga do País para a partilha de conhecimento na área da agricultura e, concretamente, do azeite.
Fátima Baptista, diretora do Instituto Mediterrâneo para a Agricultura, Ambiente e Desenvolvimento (MED), destacou o compromisso do MED em contribuir, com soluções alicerçadas no conhecimento científico, para a sustentabilidade da produção alimentar, e em particular para o setor do olival e azeite. O MED é uma unidade de I&D multidisciplinar focada na sustentabilidade de ecossistemas e sistemas alimentares no contexto mediterrânico, e uma das suas linhas temáticas de atuação é o Olival e o Azeite.
Numa apresentação dedicada a “soluções inovadoras de gestão sustentável do setor de azeite”, José Muñoz-Rojas, especialista em Geografia Rural e Ecologia da Paisagem e professor associado na Universidade de Évora, apresentou os resultados do projeto SUSTAINOLIVE. O projeto, já concluído, permitiu “melhorar a sustentabilidade do setor de azeite, através da implementação e promoção de um conjunto de soluções inovadoras de gestão sustentável, baseadas em conceitos agroecológicos”.
Para combater os problemas ambientais próprios do cultivo do olival na bacia do Mediterrâneo – como erosão e perda de fertilidade do solo, perda de biodiversidade e degradação da paisagem, superexploração de água, e poluição do ar, da água e do solo – o SUSTAINOLIVE, lançado em 2019 por um consórcio de 22 entidades de Espanha, Portugal, Itália, Grécia, Tunísia e Marrocos, incluindo universidades, centros de investigação e associações de olivicultores, desenvolveu um conjunto de soluções tecnológicas sustentáveis adaptadas à grande diversidade de condições dos olivais nesta região: coberta verde temporária espontânea ou semeada; integração da pecuária; poda das árvores e destino de resíduos da poda; fertilização orgânica; diversidade da paisagem; e uso sustentável da água.
No arranque dos trabalhos na Universidade de Évora, o key-note speaker da I Conferência Técnica do Olival demonstrou que a sustentabilidade dos olivais e da produção do azeite é “uma variável relativa e extremamente complexa”, que depende não só do contexto espacial e temporal, mas, em grande medida, “de práticas específicas de gestão”. Defendendo que a sustentabilidade que é geralmente associada a um modo de produção (biodinâmico/convencional), ou a uma densidade de plantação (super intensivo/extensivo) “não é realista”, José Muñoz-Rojas sugeriu que “é preciso avançar numa classificação das tipologias de olivais tendo por base o seu nível de sustentabilidade, que permita ultrapassar as limitações inerentes às atuais tipologias mais amplamente difundidas”.
Segundo o professor e investigador do MED, “existem já ferramentas conceituais (como serviços ecossistémicos) e operacionais (como pagamentos por resultados ou mercados de carbono) para avançar na promoção de práticas mais sustentáveis”. Mas é fundamental “continuar a medir, monitorizar e desafiar continuamente o nosso próprio conhecimento”, para implementar uma mudança para a qual “é indispensável”, de resto, a evolução das instituições e das mentalidades, explica.
Tudo isto em prol de “um investimento no futuro da agrobiodiversidade”, já visível nas parcelas orgânicas, onde “uma maior parte da produção está a ser dedicada ao aumento da matéria orgânica e da fertilidade do solo”, conclui.
Numa abordagem à sustentabilidade do olival em sebe, Hugo Sena Janeiro, diretor da AGR Global, do Grupo De Prado, apresentou as práticas, a nível ambiental, da AGR Global na olivicultura, desde os estudos prévios necessários, à preparação do terreno, correções, rega e plantação, e gestão da cultura. A reter, na intervenção de Hugo Sena Janeiro, as ideias de que “a matéria orgânica é ponto essencial para um solo fértil, com todas as vantagens conhecidas”; “a poda equilibrada permite reduzir doenças e consequentes intervenções”; “a nutrição equilibrada permite reduzir os ataques de pragas”; e é necessário “reduzir o uso de pesticidas” e “melhorar os métodos de luta [contra pragas] indiretos”.
O stress abiótico causado pela seca, chuvas e altas temperaturas na cultura da oliveira combate-se, na DAYMSA, com tecnologia. Explicando o que é o stress abiótico e que tipos existem – stress abiótico hídrico e stress abiótico térmico -, Javier Barrios Irache, diretor de produto da gama de biocontrolo da DAYMSA, apresentou as tecnologias da empresa para mitigar este fenómeno, destacando os resultados das aplicações de Naturamin WSP e do Profilm, que cria uma película física protetora.
Já a tecnologia de mecanização do solo ARG (Alfaia com Riper e Grade) protege o solo, “alicerce da vida” e um “recurso natural não renovável”. Nuno Esteves Bento, da área de desenvolvimento florestal da Fravizel Engenharia revelou como as soluções ARG permitem uma “mobilização de solo parcial e não intensiva”, a “manutenção das propriedades físicas, químicas e biológicas do solo”, o “aumento do rendimento de trabalho (h/ha)”, e a “diminuição das emissões de CO2”. Na senda do compromisso da empresa com a neutralidade carbónica, a linha de equipamentos da Fravizel para a floresta proporciona “mobilidade, eficiência energética, digitalização e redução e custos”.
A Bayer coloca a inovação ao serviço do olival, com as suas soluções de proteção para esta cultura, que Reinaldo Pereira, marketing campaign activation Portugal na Bayer CropScience, apresentou na I Conferência Técnica do Olival. Defendendo que a biodiversidade, as alterações climáticas e a segurança alimentar “são os grandes desafios da sociedade”, e que “a agricultura sustentável tem um papel fundamental no fornecimento de soluções”, o responsável sublinhou que a Bayer oferece uma “solução global, integrada e costumizada” (adaptada à realidade de cada agricultor) a nível dos vários fungicidas, herbicidas, inseticidas e soluções digitais que têm aplicação na oliveira.
Também por um olival “mais eficaz e eficiente”, João Caço, diretor executivo da Hubel Verde, abordou as vantagens dos nebulizadores pneumáticos eletrostáticos de baixo volume. Comparativamente à pulverização convencional, que gera “baixa eficiência, gotas com tamanho variável e distribuição pouco homogénea”, a pulverização electroestática garante uma “eficiência superior nos tratamentos, nebulização constante e uniforme, distribuição homogénea do princípio ativo, excelente capacidade de penetração e maior produtividade (eficácia)”, analisa o diretor da Hubel Verde.
Finalmente, e trazendo ao debate um tema essencial – a gestão eficiente da água na cultura do olival, - Gonçalo Petulante, técnico da Irritec Iberia, apresentou a solução completa da especialista mundial em rega de precisão. O portfólio inclui produtos de rega gota a gota, válvulas e acessórios para alta e baixa pressão, sistemas de filtragem, automatização e fertirrigação, produtos para rega residencial e produtos para irrigação digitalizada com comunicações IoT.
Acreditando que “o desafio para alcançar produções sustentáveis passa pelo uso eficiente de água e novas tecnologias na gestão das culturas”, a Irritec desenvolveu uma solução completa para a irrigação 4.0, através de equipamentos/sensores que recolhem e analisam dados do ambiente (clima, solo e planta).
A I Conferência Técnica do Olival integrou ainda a realização de três mesas redondas:
João Machado, ATLAS; António Machado, Agromillora Group; Roger Guardiola Buenaventura, ModpoW; José Ocaña, Treeconsulting.
Moderação: Pedro Foles, BOLSCHARE.
No que respeita a gestão do olival, “houve uma grande evolução a nível técnico, mas o conceito não mudou”, afirmou José Luís Gonzalez Ocaña, da Treeconsulting (Agroclever), que acrescentou que, aquando do desenvolvimento de um olival tudo tem de começar pela definição estratégica do projeto. Isto porque “as decisões iniciais são as que mais custam e as que podem ditar o futuro do projeto”. A este príncipio, Roger Guardiola Buenaventura, diretor de operações da ModpoW SL, acrescentou a importância de fazer um bom desenho da plantação. E, para isso, há que ter em conta fatores como os solos e a rotina diária. O objetivo é conseguir resolver parte dos potenciais problemas desde o ponto zero.
Por seu lado, João Machado, chief marketing officer (CMO) da ATLAS, lembrou que o olival é, provavelmente, a cultura que, quando é bem feita, tem resultados bem visíveis. O executivo acrescentou ainda que “no nosso país está bem-adaptada”. Basta pensar que há 30 anos era uma cultura tradicional. Quanto aos modelos modernos... “quando há condições o sistema em sebe é infalível”.
Já António Machado, responsável pelo mercado português da Agromillora Group, trouxe para cima da mesa a realidade indiscutível do Alqueva, afirmando que foi este que proporcionou a grande mudança. No entanto há que ter em conta que a realidade do Alentejo não é o Alqueva e que há muitas outras realidades na região. O certo é que a gestão da agricultura intensiva com água é muito profissional e o País não fica atrás em relação a outras entidades. No entanto, hoje a variabilidade climática é um risco suplementar, alertou António Machado. “Precisamos estar preparados para estas situações”, acrescentou o executivo da ATLAS, que defende a realização de seguros ao investimento no início da plantação. Algo que, infelizmente, “não é muito usado em Portugal”. Isso e os seguros de colheita, concluiu.
Carlos Gabirro, Biostasia; Vasco Fitas da Cruz, Universidade de Évora; Filipe Cameirinha Ramos, Figueirinha e Monte Novo.
Moderação: Gonçalo Moreira, Olivum.
Hoje a valorização dos excedentes agrícolas pode ser uma mais-valia económica para o agricultor. Esta é a opinião de Vasco Fitas da Cruz, do Departamento de Engenharia Rural, ECT & Instituto Mediterrâneo para a Agricultura, Ambiente e Desenvolvimento (MED) da Universidade de Évora, que afirmou que a compostagem é (hoje) uma alternativa muito forte, desde que bem gerida. Sem esquecer, acrescentou, a criação de novos produtos feitos a partir desses excedentes. Para Vasco Fitas da Cruz o conceito de resíduo zero prende-se não com a diminuição de pesticidas, mas sim com “resíduo zero no geral”.
Filipe Cameirinha Ramos, diretor de Figueirinha e Monte Novo defendeu que, como produtores de azeite “o bagaço é responsabilidade nossa”. Face a isto o executivo afirmou que se hoje a noção de resíduo zero na agricultura regenerativa é uma mais-valia, “caminhamos para uma obrigação”.
Já para Carlos Gabirro, CEO da Biostasia, o conceito tem a ver com “devolver o que sempre existiu no solo: o resíduo zero é o conjunto de boas práticas agrícolas que passa a responsabilidade para a agricultura”, explica Filipe Cameirinha Ramos, que acrescenta que “ter um produto certificado é defender o agricultor e o consumidor”.
“Implicações no mercado das questões planeadas em Bruxelas e tendências de consumo”
Susana Oliveira Sassetti, Olivum; Fernando Silveira do Rosário, Cooperativa Agrícola de Beja e Brinches; Mariana Matos, Casa do Azeite
Moderação: Gonçalo Morais Tristão
Quando falamos de azeite estamos a falar “de um produto 100% natural e que responde a quase todas as tendências de consumo de alimentos”, acredita Mariana Matos, secretária-geral na Casa do Azeite. Sobre as alterações climáticas e a falta de azeite, que levou ao aumento dos preços, a responsável pela Casa do Azeite apontou duas reações. A dos países produtores, em que os consumidores readaptaram o seu consumo – passaram a consumir menos, mas não saíram da categoria – e a dos países não produtores, onde os consumidores, com uma tradição menos enraizada, saíram da categoria. Para Mariana Matos isto demonstra que, nos países produtores, o mercado tem maturidade e valoriza o produto. O que pode significar que “o produto não tem de ter um preço excessivamente baixo”. Quanto ao outro cenário “temos de trabalhar na recuperação do consumo”, afirma.
Já Susana Sassetti, diretora executiva na Olivum - Associação de Olivicultores e Lagares de Portugal, apontou que o foco do consumidor incide muito em se o produto é sustentável e se faz bem à saúde. Algo que foi bem visível na pandemia. Quanto às políticas de Bruxelas, a executiva da Olivum lamenta que “infelizmente, por parte de Bruxelas, não haja apoio à produção de azeite”.
“Faz falta um compromisso de preservação, mas sem comprometer a capacidade de os agricultores produzirem”, afirmou Fernando Silveira do Rosário, presidente da Cooperativa Agrícola de Beja e Brinches. Mas há uma boa notícia. Como referiu Mariana Matos, o Conselho Europeu aprovou a revisão da PAC e das pré-PACs. O que significa que há uma perceção de que a Europa tem de diminuir a velocidade. “Os agricultores têm de ter tempo para se ajustar”, constatou a Secretária-geral na Casa do Azeite.
A I Conferência Técnica do Olival regista um balanço muito positivo, em partilha de conhecimento e networking
A I Conferência Técnica do Olival integrou ainda a apresentação da exposição de máquinas LANDINI, GRUPO I.L.C., ILERDRON e New Holland, pelo grupo Lampreia, no Jardim do Granito da Universidade de Évora.
Na véspera do evento, a organização ofereceu um jantar-networking para patrocinadores, colaboradores e parceiros, que incluiu uma degustação de azeite, cortesia do CLUB LECCIANA. Numa manhã bem preenchida por painéis de palestrantes e debates a cargo de duas dezenas de especialistas, que trouxeram diferentes perspetivas sobre o olival, a análise do Estado-da Arte de uma das culturas mais enraizadas em Portugal fez-se com inegável sucesso, numa reflexão sobre os principais desafios e oportunidades do setor, e perante uma audiência de várias dezenas de agricultores, engenheiros agrónomos, técnicos e profissionais do setor e académicos.
O resultado foi um debate inspirador e transformador sobre práticas inovadoras na produção de azeite, onde a palavra mais utilizada terá sido sustentabilidade, e que ficou marcado pela partilha de conhecimento e networking.
A I Conferência Técnica do Olival foi organizada pela revista Agriterra no âmbito dos Encontros Profissionais B2B da Induglobal, do grupo espanhol Interempresas, com o suporte técnico da Fakoy.
O Encontro contou com um conjunto de parceiros estratégicos de peso na região e no País: a Olivum - Associação de Olivicultores e Lagares de Portugal, a Casa do Azeite – Associação do Azeite de Portugal, o CEPAAL – Centro de Estudos e Promoção do Azeite do Alentejo, a Universidade de Évora e o MED – Instituto Mediterrâneo para a Agricultura, Ambiente e Desenvolvimento, sediado na Universidade de Évora. A AEMODA - Asociación Española de Maestros y Operarios de Almazara foi também um reconhecido parceiro de apoio ao evento.