Alexandre de Castilho, CEO da Hidro Ibérica com António Barbas Machado, diretor da Agromillora Portugal
30/10/2023Consegue imaginar Portugal sem olivais na sua paisagem? É praticamente impossível. Há variedades de oliveira que nos povoam há séculos e outras que agora começam a encontrar lugar no nosso país, pela mão da colaboração entre a Agromillora e a Hidro Ibérica. A paisagem transforma-se, a qualidade melhora e o olival em sebe ganha poder.
A oliveira, que se pensa ser originária da Ásia Menor, começou por ser cultivada no Irão, na Síria e na Palestina, sendo uma das árvores mais antigas cultivadas no mundo. No século XVI a.C. iniciou-se a difusão da olivicultura por toda a região mediterrânica, como parte integrante da consolidação da conquista de novos territórios por fenícios, gregos e romanos.
Ao longo dos séculos, as diversas variedades introduzidas em cada região foram sendo selecionadas com base na adaptabilidade às condições climáticas, geográficas, no rendimento em azeite, vigor ou época de colheita, entre outros fatores. Em Portugal, onde o setor olivícola é um dos mais destacados dentro da área agrícola, também se pode comprovar essa diversidade.
Avancemos para um tempo mais recente: olhando para a seleção e escolha varietal feita aquando do início da grande revolução da olivicultura moderna, no início dos anos 90, comprova-se o enorme salto evolutivo da olivicultura, com a conversão de olivais tradicionais, de compassos mais alargados, em olivais com compassos mais apertados, que permitem a formação em sebe.
O que hoje em dia é geralmente aceite pelo setor, parecia um atrevimento: plantações em sebe eram consideradas um fracasso expectável. Mas, na verdade, no olival não se fez mais do que copiar o modelo da vinha e a sua evolução natural. Foi a perspetiva económica que incentivou esta mudança, com um objetivo inicial de reduzir custos de produção relacionados com a colheita, que viria a ser 100% mecanizada e, consequentemente, mais rentável, contornando o problema crescente da falta de mão-de-obra.
É neste contexto que se abre caminho para o desenvolvimento do trabalho de empresas como a Agromillora e a Hidro Ibérica, parceiras de sucesso no campo da inovação agrícola, empenhadas em passar da teoria à prática.
A Agromillora é uma multinacional com uma história de melhoria de produção de plantas para a agricultura. Uma vocação que aparece explicitamente no seu nome, trabalhando por uma agricultura melhor, mais eficiente, mais rentável, menos sujeita a ameaças à saúde. Ao aliar-se à multinacional portuguesa Hidro Ibérica, uma PME versátil e ágil que ajuda agricultores, jovens agricultores e empresários a concretizarem projetos com serviços “Chave na Mão”, ficaram criadas as condições ideais para a implementação cuidada e eficiente de olivais em sebe. Os serviços desta parceria estimulam a proximidade entre o saber técnico e o objetivo do cliente, permitindo a tomada de decisões sobre a melhor variedade de oliveira adequada a cada caso.
Quais as vantagens e os inconvenientes do olival em sebe, com o apoio destas duas empresas? A escolha da variedade foi a de maior impacto, já que, desde 1994 até aproximadamente 2014, a grande maioria dos olivais instalados em sebe, também nos projetos apoiados pela Hidro Ibérica e Agromillora, foram plantados com oliveiras da variedade Arbequina, que reunia as caraterísticas mais indicadas para se poder adaptar ao modelo em sebe, tendo sido impulsionadora da olivicultura moderna. Ainda hoje, é a variedade mais popular e com mais superfície plantada em sebe.
Anos mais tarde, a variedade Arbosana ganhou notoriedade. Depois de quase “abandonada”, tornou-se na variedade de eleição para o modelo em sebe. O seu vigor reduzido (30%-40% inferior à Arbequina), produtividade constante e adaptabilidade a este modelo, fizeram com fosse uma escolha adequada.
Quando se fala de olival em sebe, o facto da colheita se tornar num processo simples e rápido, feito no momento ótimo de maturação da azeitona, beneficia em muito a qualidade do produto final. Não é por acaso que o olival em sebe representa aproximadamente 6% da superfície mundial total ocupada pelo olival e é a partir deste que já se obtém cerca de 35% do AVE (Azeite Virgem Extra) total mundial.
Além de todos os aspetos técnicos que se foram desenvolvendo para se conseguir produzir um AVE de qualidade a partir deste modelo, existe o fator varietal, com um papel importante, pois existem variedades que dão origem a azeites com mais concentração polifenólica, ácido oleico, mais estáveis, e outras que nem tanto. Os polifenóis são responsáveis por transmitir as caraterísticas organoléticas conhecidas como picante e amargo, tornando os azeites mais estáveis e resistentes à oxidação. Em Espanha são variedades como a Picual, a Hojiblanca ou a Cornicabra que permitem obter estes azeites e, em Portugal, podem ser a Cobrançosa, Cordovil ou Verdeal.
É aqui que reside o ponto mais fraco do olival em sebe: obtêm-se anualmente milhares de toneladas de azeite proveniente de monocultura de oliveiras Arbosana e Arbequina, com caraterísticas organoléticas de baixa intensidade em amargos e picantes, com baixa concentração em polifenóis e pouca estabilidade, perdendo o interesse comercial ao longo do ano.
Rapidamente se percebeu a necessidade de abrir o leque de variedades para se poderem obter azeites mais estáveis e com mais interesse comercial e, pela própria saúde humana, o setor sentiu essa necessidade: tornava-se imprescindível desenvolver novas variedades que, ao mesmo tempo que se adaptassem ao modelo, permitissem obter azeites com as caraterísticas ambicionadas. Em boa hora, no final dos anos 90, surgiram Programas de Melhoramento Genético (PMG), relacionados com a obtenção de novas variedades de oliveira, tanto na Universidade de Córdoba (Espanha) como na Universidade de Bari (Itália).
A regulação dos organismos geneticamente modificados (OGM) na União Europeia (UE) é considerada como uma das mais restritivas, complexas e exigentes a nível mundial. As variedades ditas tradicionais não podem ser melhoradas com esta técnica, já que a principal característica agronómica que impede a sua adaptação ao modelo em sebe é o excesso de vigor. Isto significa que não se podem obter novas variedades através da alteração artificial do material genético por meio da introdução de novos genes, que permitiria reduzir ou eliminar esta característica.
Assim sendo, o melhoramento genético para obtenção de novas variedades de oliveira é feito através de cruzamentos naturais entre duas variedades. Os PMG que as Universidades de Córdoba e Bari utilizaram para criar variedades com interesse do ponto de vista agronómico e elaiotécnico (Picual, Koroneiki, Leccino, Coratina, Ayvalak, Frantoio, Arbequina, Arbosana e outras), permitiram obter as características pretendidas de cada uma das variedades parentais.
Do PMG da Universidade de Córdoba resultaram variedades diferentes de um mesmo cruzamento entre as variedades Arbequina e Picual, tendo sido já registadas, como novas variedades de oliveira, a Sikitita-1, Sikitita-2 e Martina. As variedades Lecciana (Leccino x Arbosana) e Coriana (Arbosana x Koroneiki), foram obtidas e registadas pela Universidade de Bari, encontrando-se já difundidas em países como Portugal, Espanha, Itália, França, Marrocos e Turquia. Esta presença global permite caracterizar o comportamento de uma variedade do ponto de vista agronómico e das suas características elaiotécnicas. A caracterização varietal é lenta, pelo que são necessários vários anos para que se possam tirar conclusões com rigor.
São estas duas novas variedades, a Lecciana e Coriana, que a Hidro Ibérica está a procurar implementar nos seus novos projetos, trazendo plantas desenvolvidas pela Agromillora, segundo as melhores técnicas de mercado.
Produz um azeite muito valorizado do ponto de vista organolético, mantém as suas características de qualidade ao longo de todo o ano e possui alta concentração em polifenóis (normalmente o dobro da Arbequina) e ácido oleico, que garantem a sua estabilidade como AVE. É, sobretudo, um azeite apreciado pela sua complexidade, capaz de conter notas de picante, amargo e frutado.
O vigor é semelhante ao da variedade Arbequina e o seu sistema radicular bem desenvolvido torna-a muito rústica, recomendável para condições de sequeiro/rega deficitária ou para produção em modo biológico. Conserva a turgescência do fruto apesar da falta de água no Verão. O seu rendimento em azeite é igual ou superior ao da Arbequina. No que diz respeito à resistência ao frio, demonstra um comportamento melhor do que todas as outras variedades até agora adaptadas ao olival em sebe.
É uma variedade em que o azeite é caracterizado pelo seu amargo e picante, derivado da alta concentração em polifenóis. A sua concentração em ácido oleico é superior à da variedade Arbequina, tal como o seu rendimento em azeite. Revela-se muito interessante para obtenção de lotes monovarietais, podendo nalguns casos ser utilizada como “melhorador” daqueles AVE que possam ter perdido as suas características organoléticas ao longo do ano. Muito precoce e com rápida entrada em produção, o seu período juvenil é de apenas dois “verdes ou primaveras”.
Sendo muito indicada para zonas com disponibilidade hídrica suficiente, a Coriana permite obter um AVE com excelentes características organoléticas (picante e amargo), proporcionando uma alta produtividade, com a vantagem de ultrapassar os requisitos da EFSA para a obtenção de azeites saudáveis (>250 ppm - polifenóis).
É interessante ver como a medicina tem um papel importante na olivicultura moderna e a forma como, através de conhecimento científico, tem ajudado a valorizar a gordura vegetal mais saudável que existe: sabe-se que o azeite é composto na sua maioria por ácidos gordos monoinsaturados, aproximadamente 70%, entre os quais se salienta o ácido oleico. Existem outros componentes igualmente importantes, como as vitaminas E e A, além de diversos compostos fenólicos, que lhe conferem propriedades antioxidantes, com interesse para a saúde humana.
Existem, nos dias de hoje, bastantes evidências científicas sobre os polifenóis e a sua relação com a saúde: segundo diversos estudos da EFSA (Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar), o consumo de AVE reduz o risco de incidência de doenças cardiovasculares, se a sua concentração em polifenóis for superior a 250 mg/kg (polifenóis totais). Esta característica deve ser valorizada, já que faz do AVE a mais saudável de todas as gorduras vegetais que existem.
Não é descabido pensar num futuro, não muito longínquo, onde os azeites do tipo Arbequina/Arbosana, com concentração polifenólica inferior a 250 mg/kg e menos estabilidade, tenham uma cotação inferior a outros que proporcionem mais segurança ao comercializador do ponto de vista da estabilidade e/ou características organoléticas. Os azeites obtidos pelas novas variedades serão ao mesmo tempo mais procurados e exclusivos, pelo facto de haver menos oferta.
Muitas variedades irão surgir nos próximos tempos e certamente mudar o panorama olivícola mundial. A constante inovação tem caracterizado este setor nos últimos anos, permitindo a empresas como a Agromillora e a Hidro Ibérica desenvolverem a sua experiência e ampliarem os seus campos de atuação, não restando dúvida sobre o empoderamento do olival em sebe.