Intensificação e novas variedades obrigam a maior cuidado
Ana Lobo Santos1,2, Rosalina Marrão1 & Albino Bento1,3
1 Centro Nacional de Competências dos Frutos Secos, Edíficio Brigantia Ecopark, 5300-358 Bragança, Portugal
2 Universidad de Léon, Escuela de Doctorado, Campus de Vegazana S/N, 24071 León, Espanha
3 Centro de Investigação de Montanha, Instituto Politécnico de Bragança, Campus Sta Apolónia, 5300-253 Bragança, Portugal.
bento@ipb.pt
12/03/2021Em 2020, a amendoeira ocupava em Portugal uma superfície na ordem dos 46.000 ha, dos quais cerca de 22.000 ha na região de Trás-os-Montes, 15.000 ha na região do Alentejo e 7.000 ha na região do Algarve e uma produção da ordem das 35.000 ton de amêndoa em casca (INE, 2019; ISIP, 2020).
A intensificação do sistema produtivo e o uso de variedades com maior potencial produtivo determinam maiores cuidados culturais, sobretudo, ao nível da fertilização e proteção fitossanitária. Por outro lado, é notória a maior sensibilidade de algumas das novas variedades em uso, sobretudo a doenças, e o aparecimento de novos inimigos da cultura, principalmente nas plantações regadas, intensivas e superintensivas (Torguet et al., 2019).
A amendoeira é atacada principalmente por fungos e bactérias, que provocam doenças com grande importância económica, e por pragas de insetos que podem contribuir para a redução quantitativa e qualitativa da produção.
No que se refere às doenças, as principais são provocadas por fungos como é o caso do cancro, Diaporthe amygdali; moniliose, Monilinia laxa; mancha ocre, Polystigma amygdalinum; antracnose, Colletotrichum acutatum, entre outras de menor incidência/importância como é o caso do crivado, Wilsonomices carpophilus e da lepra, Taphrina deformans. Além das micoses, as doenças provocadas por bactérias, como a bacteriose, Xanthomonas arborícola; xylella, Xylella fastidiosa, entre outras doenças de menor importância, podem vir a causar enormes prejuízos (Quadro 1).
Cancro
O fungo infeta os ramos essencialmente por duas vias distintas, através das feridas da queda das folhas no outono e na primavera pelas feridas do crescimento dos botões florais e foliares (Lalancette et al., 2003). Nos ramos jovens são visíveis manchas castanho-avermelhadas com forma elíptica alongada a um gomo vegetativo ou floral. Os gomos afetados não se desenvolvem e ficam necrosados.
O cancro da amendoeira é de difícil gestão e a diminuição do inóculo nos pomares passa pela aplicação de tratamentos fitossanitários para evitar as novas infeções (queda da folha e abrolhamento dos gomos) e pela eliminação e destruição dos ramos doentes (primavera e verão). Em novas plantações, a escolha de variedades mais resistentes à doença deve ser tida em conta.
Moniliose
A moniliose é uma das mais importantes doenças do amendoal e é causada pelo fungo M. laxa (Adaskaveg et al., 2016). O fungo provoca murchidão das flores, sendo que as infeções ocorrem sobretudo no momento da floração em presença de chuva e em variedades que são mais suscetíveis. A infeção progride até ao ramo provocando lesões mais ou menos profundas nos tecidos (cancros), que dificultam a circulação da seiva e originam a morte dos ramos. Os frutos quando atacados acabam por mumificar e permanecer na árvore (Cothn, 2011).
A gestão da moniliose passa pela redução do inóculo nos pomares, eliminando e destruindo os frutos mumificados e os ramos atacados, poda das árvores de modo a permitir o arejamento da copa, e realização de tratamentos químicos em pré-abrolhamento (botão rosa) e à queda da folha (Gort & Sánchez 2011; Adaskaveg et al., 2016). Nos sistemas mais intensivos, pomares com rega ou em primaveras mais húmidas, pode existir a necessidade de realizar mais algum tratamento após a floração. Em novas plantações, a escolha de variedades mais resistentes à doença deve ser tida em conta.
Quadro 1 - Principais doenças associadas à amendoeira (Gort & Sánches, 2011; Torguet et al., 2019).
Mancha ocre
A mancha ocre é causada pelo fungo, P. amygdalinum, causando a redução da atividade fotossintética, desfoliações prematuras e uma queda significativa da produção (Gort & Sánchez, 2011). A doença reconhece-se facilmente, através das manchas caraterísticas de cor amarela que vão progredindo para castanho-avermelhado, acabando por necrosar.
A gestão da doença é relativamente fácil, passa pela utilização de fungicida a partir da queda das pétalas e pela redução do inóculo presente nas folhas, que se encontram no chão (Gort, 2014). A utilização de ureia cristalina pode ajudar a destruir as folhas e como tal reduzir o inóculo.
Antracnose
A antracnose é causada pelo fungo C. acutatum, ataca as flores, folhas, ramos e frutos da amendoeira, provocando elevados prejuízos. Ataca principalmente os frutos, que apresentam lesões circulares alaranjadas e ligeiramente deprimidas e gomose. Os ramos com frutos atacados ficam amarelados e as folhas secam. Posteriormente ocorre a morte dos ramos (Torguet et al. 2020).
A antracnose é de difícil gestão e a diminuição do inóculo nos pomares passa pela eliminação e destruição dos órgãos atacados (folhas caídas, frutos mumificados, ramos atacados), pela condução e poda de forma a proporcionar maior arejamento da copa, fertilização racional, bem como um tratamento preventivo, em pré-abrolhamento (botão rosa). Em variedades mais sensíveis, pomares com ataque em anos anteriores e em primaveras chuvosas existe a necessidade de repetir tratamentos até final da queda das pétalas, antes da instalação do fungo, com produtos penetrantes ou sistémicos. Em novas plantações, a escolha de variedades mais resistentes à doença deve ser tida em conta.
Figura 1 - Sintomas de: a) cancro, D. amygdali; b) moniliose, M. laxa; c) mancha ocre, P. amygdalinum e d) crivado, W. carpophilus.
A amendoeira é atacada principalmente por fungos e bactérias, que provocam doenças com grande importância económica, e por pragas de insetos que podem contribuir para a redução quantitativa e qualitativa da produção.
No que respeita às pragas, algumas das mais importantes têm ação picadora-sugadora, como a monosteira, Monosteira unicostata (Mulsant & Rey, 1852), os afídios, Myzus persicae Sulz., Brachycaudus amygdalinus Smith. e B. helichrysi Kalt, e os ácaros tetraniquídeos, Tetranychus urticae (Koch) e Panonychus ulmi (Koch). As pragas com ação mastigadora, como a Anarsia, Anarsia lineatella Zeller e Grafolita, Grapholita molesta (Busck), entre outras, também se fazem notar no amendoal. O cabeça-de-prego, Capnodis tenebrionis L., que nos estados larvares ataca as raízes e enquanto adulto ataca as folhas, e as brocas Zeuzera pyrina L. e Cossus cossus L. que provocam galerias nos troncos, entre outras pragas de menor importância ou ainda não presentes nos amendoais portugueses (Quadro 2).
Monosteira
A monosteira é uma das pragas mais importantes da amendoeira na região Mediterrânica (Pereira et al., 2018). O inseto desenvolve duas a quatro gerações por ano, dependendo sobretudo das condições climatéricas. Nos pomares é possível observar o inseto (ovos, ninfas e adultos), entre meados de abril e outubro, com máximo de ocorrência dos diferentes estados de desenvolvimento em julho/agosto.
A sua presença manifesta-se pelo aparecimento de manchas amarelas nas folhas em resultados das picadas do inseto. Posteriormente, as folhas vão ficando esbranquiçadas, secam e caem da árvore. Observam-se ainda, meladas excretadas pelo inseto, que enegrecem a página inferior das folhas e dificultam as trocas gasosas e a fotossíntese e feridas nas folhas, resultantes da deposição dos ovos no parênquima das folhas, junto à nervura principal. Em ataques severos, ocorrem desfoliações intensas, o fruto aborta ou fica mirrado levando à ocorrência de grandes perdas de produção.
A gestão da praga é fácil e passa essencialmente por manter as plantas em bom estado vegetativo e a realização de algum tratamento fitossanitário no início do verão, quando os níveis populacionais do inseto sobem exponencialmente. A aplicação de caulino, para reduzir as perdas de água no verão, mostrou diminuir os ataques de monosteira, embora para garantir uma eficácia ao longo da campanha possa ser necessário efetuar mais do que uma aplicação.
Quadro 2 - Principais pragas associadas à amendoeira (Gort & Sánches, 2011; Santos et al., 2017; Torguet et al., 2019).
Anarsia e Grafolita
A anarsia é um pequeno lepidóptero com duas a três gerações por ano, sendo possível observar os adultos entre maio e setembro. A grafolita apresenta até cinco gerações anuais, com os períodos de maior abundancia de adultos a ocorrer normalmente em meados de maio, meados de julho e finais de agosto.
A presença das pragas é facilmente observada nos rebentos novos, murchidão dos lançamentos uma vez que as lagartas alimentam-se dos primórdios foliares, depois penetram na medula e abrem galerias. As outras gerações, além dos rebentos pode atacar também os frutos, causando a queda prematura (Cañizo et al., 1990; García Marí & Ferragut, 2002).
A gestão destas pragas é fácil, pode passar por um tratamento durante o inverno, com óleo de verão e, em caso de necessidade pelo uso de Bacillus thuringiensis para as lagartas da primeira geração ou à técnica da confusão sexual, contra adultos (Nuñez & Scatoni, 2009). A aplicação de caulino também pode reduzir as populações da praga (Marcotegui et al., 2015).
Figura 2 - a) - Adultos de M. unicostata; b) Armadilhas delta para captura de A. lineatella e G. molesta; c) Sintoma de ataque de afídios; d) Adultos de C. tenebrionis.
Afídios
A amendoeira é atacada, sobretudo, por três espécies de afídios: M. persicae, B. amygdalinus e B. helichrysi. As três espécies hibernam na fase de ovo, nas rugosidades da casca. A partir de abril desenvolvem-se as várias gerações. No final do período de crescimento, em geral, dá-se a migração ou redução da atividade dos afídios.
A presença dos afídios é facilmente observada nos rebentos novos e nas folhas, de que resulta o enrolamento das folhas e deformações, com entrenós muito curtos. Em ataques intensos ocorre redução da produção nesse ano e no seguinte, dada a redução do crescimento dos ramos.
A gestão dos afídios é fácil, mas deve ser bem ponderada dada a existência de muitos inimigos naturais, nomeadamente joaninhas, sirfídeos, crisopídeos e parasitoides, que na maioria dos casos controlam as suas populações. Por vezes, no início do ataque é necessário efetuar uma intervenção fitossanitária, porque os inimigos naturais ainda estão e número muito reduzido, devendo para o efeito recorrer a um inseticida com reduzido impacto na fauna auxiliar.
Ácaros
A amendoeira é atacada sobretudos duas espécies de ácaros tetraniquídeos, o aranhiço-amarelo, T. urticae e o aranhiço-vermelho, P. ulmi.
A presença dos ácaros manifesta-se nas folhas, nas quais surgem manchas amarelas-pálidas, esbranquiçadas e prateadas. À medida que a infestação se torna mais severa, as folhas ficam acastanhadas e podem cair prematuramente. A ocorrência de aranhiço-amarelo na planta é também visível pelas teias que ficam nas folhas (Khan et al., 2009). A alimentação dos ácaros provoca o esvaziamento celular, com consequente redução da atividade fotossintética e enfraquecimento geral das plantas, perda de vigor e quebras de produção, afetando ainda a floração do ano seguinte.
A gestão dos ácaros é relativamente fácil, mas deve ser bem ponderada dada a existência de muitos inimigos naturais, nomeadamente ácaros predadores da família Phytoseiidae, mas também joaninhas, antocorídeos e crisopídeos, que na maioria dos casos controlam as suas populações (Górski e Eajfer, 2003). Além disso deve-se ter cuidado com a fertilização azotada e reduzir o stress hídrico, condição que torna as árvores mais suscetíveis aos ácaros. Por vezes, é necessário efetuar uma intervenção fitossanitária, devendo usar-se um acaricidas com reduzido impacto na fauna auxiliar.
Agradecimentos: projeto BioPest: 'Estratégias Integradas de Luta Contra Pragas …' PDR 2020-101-030960; projeto Biochestnut: 'BioChestnut- IPM - Implementar estratégias de luta …', PDR2020-1.0.1-030943