A cumprir o seu primeiro ano como diretor de Distribuição e representante AGCO Iberia, Javier Seisdedos analisa a situação atual no setor da maquinaria agrícola e o impacto da Covid-19, tanto nas marcas como nas redes comerciais.
É uma aprendizagem diária, mas tem corrido tudo muito bem. Demonstrou-se que o teletrabalho pode funcionar. Se um ano antes nos perguntassem se isto era exequível, teríamos dito que não, sobretudo em relação aos cargos comerciais, mas demonstrou-se que se pode fazer. Obviamente que ficou trabalho por fazer, que poderíamos ter feito se tivéssemos podido viajar. Em Espanha foi uma combinação, porque em Barcelona dispomos de instalações de peças de substituição que continuaram a trabalhar desde o primeiro dia, prestando um serviço muito bom, sem interromper a atividade em momento algum, apesar das limitações existentes. Entretanto, mantivemos os escritórios fechados com os funcionários em teletrabalho e, desde o início de junho, iniciámos um regresso faseado, com o qual as pessoas se sintam à vontade, sem receios e tranquilas em relação a um regresso em segurança.
Nas peças de substituição não variou praticamente nada e, de facto, o nosso volume no fecho de maio é muito similar, em termos de faturação, ao do mesmo mês de 2019. Foram solicitadas mais peças de substituição urgentes do que peças de substituição de stock por necessidades óbvias. Quanto às entregas de máquinas foi possível lidar bem com a situação, apesar dos problemas de logística. As poucas emergências que surgiram solucionámo-las com operações locais. Não ficou qualquer cliente por atender. Agora, as fábricas arrancaram em grande força, pelo que se está a proceder às entregas e a dar resposta a todas as necessidades que ficaram em espera devido à Covid-19.
Depende de cada caso, porque são as pessoas que fazem as empresas. Tratámos de estar próximos das concessões e dos seus diferentes departamentos. No início deste processo organizámos uma convenção virtual com os principais concessionários para lhes explicar qual o processo que íamos seguir, em Espanha e nas fábricas, e creio que as concessões ficaram agradecidas porque puderam conhecer o ponto de vista da AGCO. Também aproveitámos este tempo para ampliar a formação nos diferentes departamentos, usando as ferramentas virtuais, e isso correu muito bem. Para mim, pessoalmente, que estou há pouco tempo na empresa, foi muito bom, porque tive a possibilidade de falar mais ou menos tranquilamente com as concessões e conhecer os seus pontos de vista para começar a trabalhar nos projetos de 2020-21.
Concessões propriamente ditas, poucas. Terão de estar muito afetadas para que fiquem de fora, porque em relação a todas as marcas, e não só as da AGCO, estamos a tratar de ajudar as concessões que possam apresentar problemas financeiros. Assim, efetivamente, pode-se falar de um antes e um depois, não tanto porque vá desaparecer alguma concessão, mas talvez porque possam sofrer mais outro tipo de empresas mais pequenas ou colaboradores das concessões. A concessão, mesmo que não esteja bem estruturada, irá ultrapassar sem problemas esta fase difícil, dada a base tão forte em termos de pós-venda que todas têm. A grande mudança é que foram descobertas outras possibilidades de comunicação e tira-se partido das mesmas.
A curto prazo não há qualquer variação no trajeto. Tudo segue o curso estabelecido e a situação provocada pelo Coronavírus não tem qualquer impacto no mesmo.
A Covid-19 não tem qualquer impacto nesse aspeto. É uma questão de evolução das concessões, de melhoria do negócio, e neste preciso momento queremos que o trajeto seja de convergência entre as marcas e a própria concessão. O objetivo é procurar que ambas as partes saiam a ganhar.
Sem dúvida. No que respeita às marcas pudemos aproveitar, descobrir e melhorar ferramentas digitais que já tínhamos. Desde concessionários virtuais já organizados, como foi possível ver no stand da Massey Ferguson de algumas feiras internacionais, como a última FIMA, até plataformas disponíveis, no caso da Valtra e Fendt, que permitem a um vendedor mostrar o trator ao cliente de uma forma muito cómoda através do computador. Esta alternativa não é válida para todo o mundo, porque haverá clientes que continuam a pretender o contacto pessoal, mas também há outros que preferem esta via para esclarecer dúvidas técnicas antes da visita na qual se fecha a operação. Espanha tem províncias enormes e vamos tirar partido destas ferramentas.
Durante o tempo de confinamento organizámos seminários virtuais por marcas para favorecer a utilização de ferramentas e plataformas de videoconferência, de forma a que se tornem mais do que um instrumento de venda. No início custa assumi-lo, mas as vantagens notam-se de imediato.
A combinação de uma videoconferência com soluções digitais da marca através das quais o vendedor disponha de forma muito fácil de catálogos virtuais, configuradores e comparativos é fundamental para poder explicar um trator in situ com o apoio de dados. A ferramenta fundamental dos vendedores é o Whatsapp e existem muitas plataformas às quais é possível estabelecer ligação para aceder a esses conteúdos.
Definitivamente sim, mas é certo que foi devido a estas circunstâncias. A Massey Ferguson tem uma ferramenta para feiras virtuais perfeita, a funcionar, que está operacional e é muito clara. Na FIMA foi um “boom” porque apesar de ser um stand pequeno apareceu muita gente para fazer perguntas e conhecer de perto a realidade virtual. Todas as marcas da AGCO aproveitaram para dar visibilidade às plataformas existentes e tirar proveito das opiniões das nossas concessões para as melhorar. Vão ser muito utilizadas nos próximos meses.
Trator e carregador frontal Valtra.
As feiras virtuais não podem ser descartadas, mas é preciso que as marcas e as concessões as levem a sério. Isto é, implicam um trabalho prévio. É um conceito diferente, muito mais profissionalizado, mais profissional, com um retorno muito mais amplo e um custo inferior.
Quanto às feiras convencionais, vamos ver como ficam. Vejamos o que acontece na EIMA e na SIMA em fevereiro de 2021. Será necessário analisar como o Coronavírus incidiu nos resultados das grandes empresas e também será importante saber como se encontram as pessoas, visto que devemos ter em conta que a média de idades dos nossos clientes é elevada e, neste sentido, são um grupo de maior risco em relação ao Coronavírus. Portanto, as feiras no seu formato tradicional vão ser muito condicionadas pela evolução da pandemia.
Sim, porque embora haja cada vez menos agricultores, os que se mantêm trabalham os mesmos hectares e, nalguns casos, de forma mais intensiva, pelo que necessitam de mecanização. Além disso, a reconversão que estamos a presenciar do cereal para cultivos lenhosos requer outra maquinaria e o investimento é sempre necessário. O que efetivamente mudou foi o método de pagamento. Atualmente, cerca de 80% das operações exigem financiamento, ocorrendo isto também porque hoje em dia são disponibilizados produtos muito atrativos neste aspeto. Mas também porque a rentabilidade do campo não é tão elevada como antes.
O mercado de usados chama-me muito a atenção. As autoridades nacionais e europeias estão a pressionar muito devido a questões de segurança, de consumo, de emissões de gases... e não faz grande sentido que, a nós, fabricantes, nos obriguem a desenvolver equipamentos que basicamente devem ser trocados a cada 4 anos para favorecer a segurança do utilizador e proteger o ambiente, ao passo que por outro lado se abre uma porta para que entrem máquinas usadas de outros países praticamente com liberdade absoluta. O Ministério da Agricultura estabeleceu este ano alguma regulamentação a esse respeito e nesse sentido será necessário fazer algo mais. Também será interessante ver agora como fica todo o movimento transfronteiriço depois do Coronavírus e se se mantém a agilidade na circulação de mercadorias e não há problemas de controlos mais intensos, desinfeções de carga ou outras.
Estrutura da AGCO em Portugal
Em Portugal, as três principais marcas do Grupo AGCO têm os seus respetivos canais de distribuição. A única que mantém uma estrutura operacional própria dentro da empresa é a Valtra, que conta com a filial Valtractor e uma rede formada por 18 concessionários repartidos por todo o país e uma forte implantação especialmente no setor florestal.
A Fendt, através do importador Forte Lda., empresa pertencente ao Grupo Auto-Industrial, angariou prestígio entre os clientes de perfil profissional e os produtores de cereais, tanto com a sua gama de tratores como com os implementos.
A Massey Ferguson também está presente através de um importador, neste caso o Grupo Moviter, capaz de cobrir praticamente todos os nichos de mercado de tratores, incluindo os especializados e de baixa potência (menos de 50 CV), que em Portugal representam um quarto do total.
Na opinião de Javier Seisdedos, as mudanças na estrutura de propriedade das explorações que se vêm notando nos últimos tempos pouco estão a afetar a procura de equipamentos e o tipo de máquinas. “25% do mercado de tratores em Portugal reside ainda na gama abaixo dos 50 CV e isso continua a manter-se. O território tem áreas geográficas muito definidas: na zona norte abunda o minifúndio, já no sul existem explorações muito maiores, que além do mais contam agora com o novo plano de regadio e requerem máquinas de alta potência. Também existem algumas exceções referentes a zonas de arroz ou explorações de gado grandes perto do Porto, que exigem igualmente tratores grandes”.
Na AGCO não se notaram grandes mudanças e mantém-se a aposta nos tratores de alta potência com muita tecnologia, “porque o cliente português é muito exigente e quando procura este tipo de tratores pretende configurações muito altas”. “No entanto, quando procura um trator pequeno, o preço é uma condicionante muito forte e por isso entra todo o tipo de marcas”, conclui o diretor.